Não se trata de preconceito ou preciosismo. “Bairro” é uma denominação legal de um espaço urbano criado por LEI dentro de uma cidade. É uma unidade territorial dentro do todo.
O marketing rastaquera da volúpia imobiliária tem usado este termo de forma afrontosa à norma local, causando confusão. Nem cito os que esta manobra “criou”. A mídia tem uma venda nos olhas e está à venda de quem mais paga. Aqui, estes esquecem que o interesse privado não pode se sobrepor ao público.
Não bastasse isto tudo, agora a própria Prefeitura quer alargar na marra o histórico IV Distrito. Ele veio ao longo dos tempos tendo uma "ampliação", mas sem o atual caráter perverso para diminuir tributos a setores privilegiados, para os seus apaniguados.
No momento em que a revisão do Plano Diretor deveria estar em debate na Câmara, inventou-se um "Plano Diretor" para o Centro Histórico e outro para o IV Distrito. Não existe um "plano" nem governança que se sustente, se não for global, com olhar sobre o conjunto todo, para formatar um uníssono na diversidade.
Porto Alegre tem suas marcas e para modificá-las é preciso um repensar. Não estamos nem pensando e nem repensando. A cópia de modelos exógenos ou provações por interesses comandam o Paço Municipal.
A população desconhece o atual plano, porque a Administração esconde o plano e badala os remendos ilegais. Muito menos sabe da proposta que se discute, já com uma “proposta” da terceira ou quarta consultoria. Agora, quem dá as linhas é a Consultoria Ernest Young. A EY é líder global em serviços de auditoria, impostos, transações e consultoria. Ou seja, tudo menos Plano Diretor. Isto é Porto Alegre.
Em 1914, nosso Plano de Melhoramentos foi comandado por um servidor público o engenheiro-arquiteto João Moreira Maciel e uma pequena equipe. Naqueles tempos não se conhecia o que pudesse ser uma participação cidadã.
Em 1959 e 1979, os planos vierem do seio da Administração e seus técnicos. Em 1999, pela primeira vem tivemos um PPDUA com ampla participação dos moradores da capital. A revisão de 2009 foi a revisão da pressão do setor imobiliário que já vinha com “sede ao pote”.
A revisão deveria ter começado em 2020. Estamos em 2024 e a mídia anuncia, mais uma vez, que a revisão do Plano Diretor de Porto Alegre vai atrasar. Depois da conferência realizada na PUCRS há um mês, a Secretaria Municipal de Meio Ambiente, Urbanismo e Sustentabilidade (Smamus) ficou encarregada de redigir as propostas para serem discutidas em audiência pública na Câmara. Mas a Smamus ainda não tem o texto que embasará a revisão, diz um jornal da capital.
Estamos, portanto, sob o comando de um Plano Diretor vencido em parte, com planos fatiados para dois bairros, vendas de índices com critérios duvidosos e obscuros, com liberações de áreas e edificações patrimonializadas.
É “um deus dará”, é um “salve-se quem puder”. Isto não é planejamento, não tem governança de fato, tem o comando dos interesses imobiliários, tudo está à venda, sejam economias fechadas por falta de ocupação, seja a cidade à venda a quem tiver alcance ao poder. E quem deveria falar, denunciar, cobrar tem uma maioria com venda nos olhos, para não ver o descalabro em que se vive.
Na Câmara, há um silêncio obsequioso, estranho a um Parlamento.
Adeli Sell é vereador em Porto Alegre.
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