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Vítima, vitimização, direito e psicanálise

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Vamos elaborar um ensaio para discernir o que caracteriza uma conduta de vitimização ou queixas procedentes e a busca por justiça.

No direito criminal, a vítima é quem sofre um delito ou crime. Seu comportamento, de acordo com o Código Penal (CP), art. 59, só é relevante para a dosimetria da pena, especialmente em casos de legítima defesa. Ouvir psicólogos em uma avaliação psicológica profunda deveria ser uma prática interdisciplinar constante para que os juízes possam julgar melhor as partes envolvidas.

No diagnóstico estrutural psicanalítico, podemos inferir que a insatisfação histérica tende a resultar em um gozo recorrente, caracterizado por vitimização e queixas, geralmente confusas na busca por realização de desejos. Em casos de neurose obsessiva, a tendência, diante de um desejo impossível, é que o indivíduo obsessivo, mesmo sendo vítima, busque excessivamente em si a responsabilidade por seu sofrimento. Na perspectiva lacaniana, o sujeito histérico é aquele que “se faz mestre do mestre”, enquanto o obsessivo é o servo.

Em casos de fobia, o objeto fóbico ocupa um lugar simbólico do que realmente causa o sofrimento, de forma inconsciente. Sendo uma psiconeurose, envolve o conflito sexual edípico, como no caso de “O pequeno Hans”, de Freud, em que o medo da figura do cavalo era um deslocamento do lugar do pai aterrorizante.

Em psicopatologias graves, é necessário um cuidado especial na avaliação, pois, na paranoia, pode surgir algo que se assemelhe à vitimização, sem realmente ser. Isso ocorre porque o psicótico não representa; ele se apresenta, como diria Lacan, sendo de fato uma vítima alienada ao desejo do Outro.

Os perversos, por outro lado, podem, para obter vantagens, negar a castração e a lei, fazendo-se de vítimas, manipulando opiniões por meio de calúnias, difamações e armações de diversas ordens.

No contexto político e social, genocídios têm historicamente produzido vítimas reais. Embora Israel tenha sido vítima do terror, não pode ficar aprisionado em uma postura de vitimização, acreditando que sempre sofre por causa do antissemitismo, esquecendo-se de que os palestinos são, sim, as maiores vítimas deste prolongado conflito étnico-religioso e de classes.

Parabenizo os municípios de Eldorado, São Leopoldo, Novo Hamburgo, Alvorada e Pelotas, que não reelegeram prefeitos ou representantes envolvidos na tragédia político-ambiental no RS. Os responsáveis não podem se vitimizar, transferindo suas responsabilidades para o clima, outros gestores ou para as próprias pessoas. Quem votou na imprevidência é, em certa medida, vítima de si mesmo e pode mudar essa posição masoquista no segundo turno.

Quanto ao olhar clínico sobre o tema: a manipulação é comum na infância e deve ser superada pelos limites da educação. Pessoas imaturas, infantilizadas, seguem um padrão vitimista, sem transformar queixas em demandas que implicam responsabilidades, algo esperado em um tratamento psicanalítico.

A maneira emotiva com que uma pessoa expressa sofrimentos reais requer escuta, não rótulos superficiais. Seja na transferência com o analista ou em desabafos com pessoas próximas, o acolhimento é valioso. Em qualquer situação, como em abusos ou relações tóxicas, poder falar facilita a ressignificação do sofrimento.


Gaio Fontella é psicólogo, psicanalista, comentarista e produtor do “Café com Análise”, no Youtube.


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